segunda-feira, 8 de março de 2010

O Check-up de Barack Obama


Em Editorial recém publicado nos Archives of Internal Medicine, Rita Redberg criticou a inclusão do escore de cálcio coronário no check-up de Barack Obama. De acordo com a autora, o presidente americano é de baixo risco cardiovascular e este exame não traria informação adicional. Além disso, como já comentamos neste Blog, os modernos exames de tomografia multi-slice oferecem uma quantidade não desprezível de radiação e não devemos banalizar as indicações.

A crítica ao check-up do presidente americano é embasada no paradigma de que são os pacientes de risco intermediário que se beneficiam do escore de cálcio. Há uma lógica de que o risco intermediário será reclassificado para baixo ou alto risco. Sendo assim, Obama não se beneficiaria do exame, pois ele é de baixo risco.

Se por um lado, esta crítica aparenta propor uma racionalidade na utilização do exame, por outro lado existe um marketing disfarçado neste tipo de afirmação. Ou seja, para o executor no exame, é melhor o paradigma de que são os indivíduos de risco intermediário que devem fazer o exame, pois estes são a maioria dos pacientes em consultórios cardiológicos, o que gera um maior volume de exames. Ao mesmo tempo em que nega a indicação para pacientes como Obama, a autora indica o teste para indivíduos de risco intermediário.

Mas existem evidências demonstrando que há mais benefício clínico em realizar escore de cálcio nos pacientes de risco intermediário, do que nos de baixo risco? Não.
E não faz muito sentido, por três motivos: primeiro, a estratégia preventiva de pacientes de risco intermediário já é muito semelhante à de pacientes com alto risco, sem doença cardiovascular. Não mudaria conduta. Segundo, não temos autorização científica para deixar de utilizar estratégias em um paciente de risco intermediário, baseado um resultado de escore de cálcio baixo. Não se sabe se a subestimativa do risco é benéfica ou se expõe mais os pacientes. Terceiro, grande parte dos pacientes de risco intermediário são de risco intermediário mesmo, e não devem ser reclassificados.

Por outro lado, quem potencialmente mais se beneficia dos escore de cálcio são os pacientes do tipo Obama. Ou seja, há um subgrupo de pacientes de baixo risco, que o Escore de Framingham pode estar subestimando o risco. E isso ocorre em duas situações: no tabagismo ou na história familiar para DAC precoce. O Framingham incorpora tabagismo de forma simplória e dicotômica, enquanto história familiar nem é considerada neste escore e mesmo se fosse, sua penetração fenotípica é imprevisível.

Obama tem 48 anos, segundo a Rede CNN tem colesterol total de 209, HDL-colesterol de 62, pressão arterial normal e é tabagista. Desta forma, seu risco de Framingham é 9%, ainda na categoria de baixo risco. Porém ao considerar Obama tabagista, não estamos considerando quantos cigarros ele fuma, nem há quantos anos ele fuma. E mesmo se considerássemos, cada um responde de uma forma diferente ao cigarro. Por isso que os tabagistas não são bem representados pelos escores clínicos. Aí que entra o Escore de Cálcio. Ele vai nos dizer se Obama é de baixo risco mesmo. E mudar o conceito de um paciente de baixo risco para risco moderado, ou até mesmo para alto risco, implica em uma mudança de conduta muito mais relevante do que reclassificar um indivídio de risco moderado para alto risco.

Portanto, a Editora do Archives of Internal Medicine entrou no discurso marketeiro de fazer escore de cálcio para indivíduos de risco intermediário, ao mesmo tempo perdendo a oportunidade de exemplificar com o caso do presidente americano qual o subgrupo de pacientes que potencialmente mais se beneficia deste exame.

Claro, este subgrupo dos pacientes de baixo risco representa um número bem menor do que toda a população de risco intermediário. Seria menos lucrativo para os serviços de tomografia. Paradoxalmente, é exatamente com estes gastos descenessários que Obama está preocupado.

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