Para exemplificar esta questão utilizaremos o ensaio clínico JUPITER, que randomizou pacientes para uso de rosuvastatina ou placebo, mostrando que a droga reduz eventos cardiovasculares em pacientes de risco intermediário, com LDL “normal”. Observem a frase que mostra o resultado principal deste estudo: The rates of the primary end point were 0.77 and 1.36 per 100 person-years of follow-up in the rosuvastatin and placebo groups, respectively (hazard ratio for rosuvastatin, 0.56; 95% confidence interval [CI], 0.46 to 0.69).
À primeira vista esta frase nos parece estranha, pois normalmente os ensaios clínicos relatam a incidência simples de eventos, que é representada por uma fração para cada grupo. Por exemplo, no estudo JUPITER seria droga 1.6% vs. placebo 2.8% - mais intuitivo para compreender. No entanto, a forma utilizada pelo estudo é a taxa de incidência (incidence rate), que descreve o número de eventos dividido por unidades de tempo. Ou seja, ao invés de relatar o número de eventos/número de pessoas em cada grupo, os autores relatam o número de eventos/número de unidades de tempo de acompanhamento. O denominador da taxa de incidência é o número de pessoas-ano. Se um estudo tem 5 pessoas e cada pessoa foi acompanhada por 10 anos, no denominador será 50 pessoas-ano, ao invés de 5 pessoas.
A vantagem desta metodologia é levar em conta não só o número de pessoas, mas também o tempo que cada um foi acompanhado. Esta técnica é mais útil quando não há uniformidade de tempo de acompanhamento entre os pacientes. E foi justamente isso que ocorreu no estudo JUPITER, pois este foi interrompido precocemente e muitos pacientes não tinham sido acompanhados o tempo inicialmente planejado.
Hipoteticamente, se no grupo placebo os pacientes tivessem sido acompanhados por mais tempo do que no grupo droga, a incidência simples de eventos no primeiro poderia ser maior simplesmente porque os pacientes ficaram expostos mais tempo. Porém se o resultado é relatado em taxa de incidência, se previne este potencial viés.
A taxa de incidência é também chamada de hazard. O hazard do grupo droga dividido pelo hazard do grupo placebo resulta aproximadamente no hazard ratio, medida que estamos acostumados a ler nos ensaios clínicos, cuja interpretação é parecida com o risco relativo, só que leva em conta o tempo que cada paciente foi acompanhado.
Agora fica mais fácil para entender o que os autores do JUPITER quiseram dizer com 0.77 and 1.36 per 100 person-years of follow-up. Só mais um detalhe: ao invés de usar per person-years, eles usaram per 100 person-years - da mesma forma que se usa percentual (a cada 100 pessoas).
Nossa, nunca tinha entendido isto tão facilmente. Parabéns pela didática!
ResponderExcluirPrezado Luiz Cláudio.
ResponderExcluirNos estudos randomizados ("trials") sobre stents e Cirurgia de Revascularização, muitos artigos comentam sobre o HR. Ex. pacientes acima de 65 anos (HR 0,82, 95% Cl:0,70, 0,97) tem mortalidade menor com cirurgia RVM que o grupo stent.
Como interpretar o HR?
Grato Roberto Carvalho rcarvalho62@uol.com.br
Parabéns pela forma concisa e prática para esclarecer um tema tão espinhoso!
ResponderExcluirParabéns pela didática! Ótima explicação!
ResponderExcluirDe fato, parabéns pela didática! Obrigado pela explicação!
ResponderExcluirMuito bom!
ResponderExcluirDe forma simples e enxuta me fez ter uma boa ideia.
Obrigado.
Marcelo
Realmente, explicação objetiva e didática.
ResponderExcluirDoutor! Fui sua aluna na EBMSP e agora sou residente de clinica médica da USP... E aqui estou eu de volta aos seus materiais estudando-os. Muito bacana sentir que você continua sendo uma das minhas melhores referências de estudo. Obrigada!
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