Esta semana Dr. Bruno Bezerril, pesquisador do NIH em Washington D.C., nos chamou atenção para um intrigante artigo publicado em 2006 no British Medical Journal, intitulado Phenotypic differences between male physicians, surgeons, and film stars: comparative study (BMJ 2006;333:1291–3). Este artigo demonstra que médicos cirurgiões são mais altos e mais bonitos do que médicos clínicos. A beleza foi mensurada por um escore que variava de 1 (feio) a 7 (muito bonito). Vejam resultado: "We contacted 14 surgeons and 16 physicians. Surgeons had statistically significantly higher good looking scores than physicians (4.39 v 3.65; P = 0.010)."
Qualquer evidência científica deve passar pelo crivo que três perguntas: (1) A evidência é verdadeira? (2) A evidência é de magnitude relevante? (3) A evidência é aplicável? Vamos analisar.
Em relação à veracidade da informação, a primeira questão é checar se o achado foi devido ao acaso. Isto se verifica pelo famoso valor de P, que no caso foi de 0.01, indicando que a probabilidade do acaso ser responsável pelo fenômeno foi de 1%, ou seja, desprezível (menor que 5%). Pois bem, o acaso está afastado. Mas devemos saber que além do acaso há outros erros que podem levar a resultados espúrios. Por exemplo, variáveis de confusão, que são características que podem diferir entre os dois grupos, provocando resultados não dependentes da variável preditora principal (tipo de médico). Apesar dos autores terem pareado os indivíduos por idade, estes não mostraram uma tabela comparando as características dos dois grupos, o que seria imprescindível para fazermos uma análise exploratória à procura de fatores de confusão. Este tipo de erro então não pode ser afastado pelo estudo. Por fim, devemos avaliar se existem vieses, ou seja, erros sistemáticos na metodologia do trabalho que possam influenciar os resultados. Os autores mencionam que foram enfermeiras do próprio hospital que deram a nota de beleza aos médicos, a partir de fotos digitalizadas. Então esta não foi uma avaliação cega, pois as enfermeiras sabem qual a especialidade dos médicos e o glamour típico da função cirúrgica pode ter enviesado esta análise. Isto se chama viés de observação. Portanto, tendo em vista estas questões, não podemos afirmar ao certo se esta evidência é verdadeira.
Qualquer evidência científica deve passar pelo crivo que três perguntas: (1) A evidência é verdadeira? (2) A evidência é de magnitude relevante? (3) A evidência é aplicável? Vamos analisar.
Em relação à veracidade da informação, a primeira questão é checar se o achado foi devido ao acaso. Isto se verifica pelo famoso valor de P, que no caso foi de 0.01, indicando que a probabilidade do acaso ser responsável pelo fenômeno foi de 1%, ou seja, desprezível (menor que 5%). Pois bem, o acaso está afastado. Mas devemos saber que além do acaso há outros erros que podem levar a resultados espúrios. Por exemplo, variáveis de confusão, que são características que podem diferir entre os dois grupos, provocando resultados não dependentes da variável preditora principal (tipo de médico). Apesar dos autores terem pareado os indivíduos por idade, estes não mostraram uma tabela comparando as características dos dois grupos, o que seria imprescindível para fazermos uma análise exploratória à procura de fatores de confusão. Este tipo de erro então não pode ser afastado pelo estudo. Por fim, devemos avaliar se existem vieses, ou seja, erros sistemáticos na metodologia do trabalho que possam influenciar os resultados. Os autores mencionam que foram enfermeiras do próprio hospital que deram a nota de beleza aos médicos, a partir de fotos digitalizadas. Então esta não foi uma avaliação cega, pois as enfermeiras sabem qual a especialidade dos médicos e o glamour típico da função cirúrgica pode ter enviesado esta análise. Isto se chama viés de observação. Portanto, tendo em vista estas questões, não podemos afirmar ao certo se esta evidência é verdadeira.
Segunda pergunta: relevância. Devemos lembrar que significância estatística é diferente de significância biológica. Apesar da diferença ter sido estatisticamente significante, um escore de beleza de 4.4 não é tão diferente de 3.7. Do ponto de vista prático, a beleza é igual nos dois tipos de médico, pois esta diferença numérica não deve ser tão perceptível a olho nu. Portanto, o resultado não é relevante.
Terceiro ponto, aplicabilidade. Qual a validade externa deste trabalho realizado apenas em um hospital de Barcelona. Isto se aplica à realidade da Espanha como um todo? Isto se aplica ao Brasi?. Não sabemos. Portanto não podemos afirmar que o resultado é aplicável à nossa realidade.
Em conclusão, sob o crivo da medicina baseada em evidências, este interessante artigo não deve influenciar nossa conduta clínica, ou conduta social.
Por falar nisso, há uma nova nomenclatura nos Estados Unidos, que chama médicos clínicos de médicos cognitivos, enquanto os demais são chamados de médicos intervencionistas. Você prefere ser um médico cognitivo ou um médico intervencionista? Qual o mais elegante?
Esta é uma seara bastante polêmica... Com relação ao artigo, o viés de observação cabe mais algumas ressalvas: o padrão socioeconômico vinculado nos meios de comunicação as especialidades cirúrgicas são muito mais alegóricos do que as especialidades clínicas. Basta vermos os exemplos dos principais personagens de séries de televisão e filmes exibidos atualmente. Basta dizer que o único representante das especialidades clínicas mais visível é o Dr House (que está a margem das tendências centrais de beleza...).
ResponderExcluirOutra questão é com relação a amostra. Se a população de interesse eram as mulheres, deveriam haver representantes de todos os extratos de atividade, como auxiliares de limpeza, médicas, recepcionistas, nutricionistas etc. Pelo método de seleção amostral, o máximo que se pode dizer é que as enfermeiras do distinto hospital preferem o cirurgiões...
Por fim, um último questionamento: o Dr Bruno, com atuação voltada a ciência básica, referindo essa eterna discussão entre as especialidades clínicas e as cirúrgicas... Será que a leitura desse artigo foi casual ou fruto de revisão literária para futuras escolhas entre essas duas áreas?
Adorei o comentário de Luis Cláudio e o também o de Paulo Goes. O artigo nos faz refletir sobre o que é realmente "relevante na medicina" e também sobre a qualidade e o interesse daquilo que as revistas "querem publicar"....
ResponderExcluirComo "médica cognitiva" e como representante da população de interesse na hora de escolher "os mais belos" ainda prefiro George Clooney...
Para Paulo: meu caro, se ainda existir futura escolha entre essas áreas ela vai depender do valor de p.
ResponderExcluirAprendeu direitinho nas disciplinas de pesquisa hein?
Abraço saudoso